Por mais bem intencionadas que vos soem estas frases, aprendam que as vemos como ofensas veladas. Estão a chamar-nos de ridículas, dramáticas e apoquentadas - e muito embora tudo se aplique, não queremos saber.
Sob prisma nenhum nos acalmam, no entanto, podem fazer-nos ficar de todas as cores, emitir sons de chaleira a ferver, gritar impropérios, cuspir serpentes venenosas e chamas ocasionais e intensificar ou recuperar toda a indisposição de que vocês esperariam já se ter livrado.
Considerem-se aconselhados: nunca na história da humanidade estas deixas resultaram.
Cobras? Aranhas? Alturas? Espaços fechados? Nada disso. Uma pessoa out como eu, também não podia estar dentro das maiores tendências de medo (preferem dizer receio, não é?). Sou de nicho: tenho pavor de sobras de comida.
E gostava muito de vos dizer que isto era uma metáfora para mostrar como sou solidária com a população mundial que passa fome e portanto odeio desperdiçar, mas o caso é mesmo que quando sobra comida no prato (ou no tacho) e já não é para efeito alimentar, passa a causar-me um ligeiro nojo. Agora venham as pragas, já estou a ouvir a minha avô a dizer "a comida nunca é nojo" enquanto me atiça o chinelo e um de vocês caros comentadores - ou vários - a mandar-me queimar no Inferno (descansem, que estou certa que vou). Mas é uma coisa cá de dentro e não há meio de controlar: num minuto estou a comer o arrozinho quente e é delicioso, no outro o arroz arrefece, está de sobra no rebordo do prato e custa-me horrores lidar com o bicho-arroz, mesmo para a infame prática de raspar o prato com um guardanapo em direção ao lixo (arrepia-me só de pensar).
Podia dar-me para pior, nasci assim. E à falta do Moço e da minha mãe sempre tive de engolir esta pseudo-fobia e lidar com o resto-de-comida o melhor que pude. Afinal levei quase dez anos a morar sozinha ou com roommate e uma pessoa tem de se fazer à vida. Hoje em dia, sempre que possível, vigora o acordo com o rapaz: eu faço a comida, ele desfaz-se dela. Salvo seja.
Isto para dizer que hoje, por motivos que agora não interessam nada, vi-me a almoçar sozinha no El Corte Inglès (amén, H3 Limone) e passei um autêntico pesadelo quando terminei a refeição. Não é que os sacanas fizeram uma espécie de corredor da morte na zona da restauração? A pessoa vai de boa vontade, quer facilitar e segue os sinais para ir pousar a bandeja com o prato. E tem de passar por um corredor de restos de comida, ladeado de tabuleiros de todo o mundo que almoçou, largados de um lado e outro da paliçada, para cumprir o seu civilizado dever. Ao menos é no El Corte Inglès, onde ninguém com doenças (tipo pobreza) vai. Só eu.
Para a próxima, almoço um gelado da Hagen-dasz e já não tenho estes problemas.
Só porque tem castelos de reis, grutas de mistérios, serras de perder de vista, praias de ondas altas, matas para piqueniques, uma cultura cheia de vida e modernidade em cima disto tudo? Deixem lá. Vão antes a outro lado.
Sabes (outra vez) que és a perfeita dona de casa quando a coisa que mais te faz passar na vida é a porra do penduricalho de panos que não se fica na parede e está sempre a cair. Ou então, para isso, tinha de saber o nome correto do penduricalho de panos.
Alguém me aconselha ou continuo a dar-lhe cabeçadas para ver se é desta que fica nos sítio? Tipo, até sangrar?